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Resenha do Livro: Memórias de uma gueixa

Memórias de uma gueixa
Memórias de uma gueixa

Título: Memórias de uma gueixa

Autor: Arthur Golden

Tradução: Lya Luft

Capa: Luciana Mello e Monika Mayer

Editora: Editora Imago

Ano: 2006

Páginas: 460

Classificação Indicativa: 16 anos e acima

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Sinopse

Memórias de uma gueixa“, brilhante romance de estréia de Arthur Golden, é um verdadeiro tour de force: as confissões de uma das gueixas mais renomadas do Japão, narradas com autenticidade rara e uma forma ainda mais rara de lirismo.

Com uma voz ao mesmo tempo assombradora e absolutamente direta, a já idosa Nitta Sayuri nos conta as histórias de sua vida de gueixa. Conduzidos por essa voz, nós entramos num mundo onde o que mais conta são as aparências, onde pode-se leiloar a virgindade de uma criança, onde as mulheres são treinadas para enfeitiçar os homens mais poderosos, e onde o amor é desprezado como uma ilusão.

Seu relato tem início numa vila pobre de pescadores, em 1929, onde a menina de nove anos é tirada de casa e vendida como escrava. Pouco a pouco, vamos acompanhar sua transformação pelas artes da dança e da música, do vestuário e da maquilagem; e a educação para detalhes como a maneira de servir saquê revelando apenas um ponto do lado interno do pulso – armas e mais armas para as batalhas pela atenção e o dinheiro dos homens. Mas a Segunda Guerra força o fechamento das casas de gueixas e Sayuri vê-se forçada a se reinventar em outros termos, em outras paisagens.

Memórias de uma gueixa” é um romance fascinante, para ser lido de várias maneiras: como um mergulho profundo na tradicional cultura e história do Japão, ou um romance sobre a sexualidade, e ainda, como uma descrição minuciosa da alma de uma mulher já apresentada por um homem.

Livro “Memórias de uma gueixa”

O destino não é sempre como uma festa no fim da tarde. Ás vezes é apenas lutar na vida, dia após dia

Memórias de uma gueixa”, de Arthur Golden, é um daqueles livros que te prende do início ao fim, não só pelo retrato histórico que ele faz do Japão do século XX, nos colocando totalmente imersos nas tradições e rituais que cercam o universo das gueixas, mas também pelo retrato delicado e intenso de uma alma humana que não só viveu, mas sobreviveu a toda dor que cerca a beleza, a toda disciplina que cerca o sucesso, a toda ganância que cerca a inocência, a todos os infortúnios que cercam a vida e a toda ilusão que cerca o amor.   

Com uma narrativa envolvente, colocando sua personagem principal contando a própria história, temos um equilibro entre a dor e o encanto, o desespero e a esperança, a inocência e a malícia, nos mostrando como a vida pode tecer-nos um destino, forças externas sob as quais não temos controle algum, mas que tudo pode ser transformado se souber se movimentar, não contra, mas junto com elas. Além de nos mostrar a coragem que é necessária para mudar o próprio destino, não apenas para ir atrás do que se seja deseja, mas principalmente para lidar com o que vai ser deixado para trás.

Memórias de uma gueixa” nos apresenta a vida da pequena Chiyo Sakamoto, uma garotinha que morava em uma aldeia chamada Yoroido, no Mar do Japão, um lugar que quase ninguém visita. Vivia em uma casinha simples, que ficava perto de um penhasco, onde o vento do oceano soprava o tempo todo. Morava com seu pai, que trabalhava como pescador, com sua mãe, que estava doente e com sua irmã Satsu, seis anos mais velha.

Chiyo se parecia muito com sua mãe, que costumava dizer que eram feitas do mesmo jeito, tinham os mesmos olhos peculiares, do tipo que quase nunca se vê pelo Japão, um cinza translúcido. Adivinhas costumavam dizer que elas tinham olhos assim, porque havia água demais em suas personalidades, tanta que os outros elementos quase nem estavam presentes. A água nunca espera, muda de forma e escorre ao redor das coisas, encontra a trilha secreta que ninguém imaginaria, é o mais versátil dos elementos.

Aos nove anos de idade, sua mãe piorou muito de saúde, e em uma visita do médico, ouviu-o dizendo ao seu pai que ela logo morreria. Seu pai a manda ir comprar incenso para o altar, e no meio do caminho, ela escorrega e cai, se machucando. É quando conhece o Sr. Tanaka Ichiro, diretor da Companhia Japonesa de Frutos do Mar.

Ele cuida de seus ferimentos e pergunta sobre sua história. E ao saber que a mãe esta doente e o pai sendo tão velho, se preocupa com quem cuidará da menina, o que o faz lembrar da própria história, de quando ele se tornou uma criança sozinha no mundo. Decidindo ajudar, vai até a casa dela, conversar com seu pai, para lhe fazer uma proposta. Chiyo, em sua inocência, passa a acreditar que o Sr. Tanaka adotaria a ela e a sua família.

Memórias de uma gueixa” nos mostra que um dia ela e Satsu são levadas até o escritório do Sr. Tanaka, onde encontram uma velha senhora que se põe a examinar fisicamente as meninas, cada pedacinho de seus corpos, de maneira bruta e invasiva. Dias depois são chamadas novamente, e ao questionar o pai, a única resposta que Chiyo recebe é um sinal afirmativo para irem até o Sr. Tanaka.

Foram levadas até um homem que nunca haviam visto, e esse, as levavam para algum lugar fora de sua pequena aldeia. Ainda que fizesse perguntas sobre onde estavam indo, ele não respondia, com isso ela criava suas próprias respostas, ainda acreditando na ideia de adoção. O que mal sabia, é que tanto ela quanto a irmã, acabavam de serem vendidas para o Distrito de Gion, o lar das gueixas, em Kioto, e cada uma para um lugar diferente.

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Frase do livro “Memórias de uma gueixa”, de Arthur Golden

Chiyo foi arrastada para dentro de um Okiya, onde teve a sua primeira visão de Hatsumomo, uma das gueixas mais famosas daquele distrito, conhecendo ali, a beleza e o gênio intragável daquela que um dia tentaria destrui-la. Conhece também uma garotinha, da mesma idade que ela, com quem faria amizade em pouco tempo e a apelidaria de Abóbora. Ela havia nascido em Sapporo, sua mãe morreu quando tinha cinco anos, seu pai a mandou para morar com um tio, e quando esse perdeu o seu negócio, ficou sem condições de cria-la, mandando-a para Gion, seu pai tendo morrido um ano antes, ela não tinha para onde fugir.

Chiyo foi deixada aos cuidados de uma mulher que disse para chamá-la de Titia, essa lhe explica que agora ela viveria ali, no Okiya Nitta, caso Mamãe e Vovó gostassem dela. Descobre que teria que aprender a como se portar, trabalhar duro e nunca sair sem permissão. Fazer tudo o que lhe fosse mandado e não dar trabalho, do contrário, levaria uma surra.  Se fizesse tudo direitinho, em dois ou três meses poderia começar a aprender as artes de uma gueixa, pois não havia sido comprada para ser criada, se assim fosse, seria colocada na rua.

Começar o treinamento de gueixa, significava frequentar uma escola, onde teria aulas como música, dança e cerimônia do chá. Todas as aprendizes de gueixa estudavam no mesmo lugar, acreditando então que lá encontraria a sua irmã, Chiyo decidiu se comportar e ser obediente, mas Vovó sempre dificultava as coisas, aumentando suas tarefas, e Hatsumomo piorava tudo, com humilhações diárias e torturas psicológicas, como brincar com a informação de que sua irmã esteve lá, perguntando por ela e querendo passar informações para que pudessem fugir, passando a manipular e chantagear a menina.

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Frase do livro “Memórias de uma gueixa”, de Arthur Golden

Em “Memórias de uma gueixa”, vemos Chiyo começando os seus estudos, sendo apresentada as professoras e dando início as suas aulas, acompanhada por Abóbora, que já havia começado as suas uma semana depois da chegada de Chiyo. Procurou por sua irmã, mas não encontrou nenhum sinal de Satsu. Foi levada até o Registro de Gion, pois todas as aprendizes precisavam se registrar, quando perguntou por ela, não havia nenhum registro no nome de sua irmã.

Enquanto tentava seguir com os seus dias, buscando uma maneira de sobreviver até encontrar a irmã, Chiyo descobriu que uma vez por semana, Hatsumomo, que era proibida de namorar, encontrava o seu namorado escondido, fora ou dentro do Okiya, e que todas as criadas sabiam, mas que ninguém contava nada a Mamãe, pois Hatsumomo fazia questão de mostrar a elas o quanto era ardilosa e poderosa em relação a elas.

Um dia, Hatsumomo chega no Okiya com sua amiga Korin, carregando um quimono que pertencia a outra gueixa, uma rival que ela odiava, Mameha. Como provocação a uma e humilhação a outra, ordenou que Chiyo treinasse, com tinta e pincel, sua caligrafia em cima do quimono, e que fosse entregá-lo, em um embrulho, na casa de Mameha.

Quando descobriram o que aconteceu, tendo uma criada visto Chiyo escrevendo por cima do quimono, Mamãe ordena uma surra de vara e confinamento no Okiya por cinquenta dias, iria apenas as aulas. E acrescenta as suas dívidas, que consistiam de suas refeições e aulas, bem como o valor que ela havia custado em sua compra, o pagamento do quimono de Mameha, um valor que ela certamente não conseguiria pagar. Titia a alerta para não confiar em Hatsumomo.

Mas vemos em “Memórias de uma gueixa”, que Hatsumomo não se dando por satisfeita, instiga a Chiyo, contando-lhe o endereço de onde está sua irmã, mas não sobre como chegar até lá. E mesmo sabendo do seu confinamento, cria uma situação para que a menina saia do Okiya, sabendo que ela daria um jeito de descobrir sobre como chegar até o lugar. E de fato, Chiyo andando por ruas que mal conhecia, acaba encontrando a irmã, mas não em um Okiya, e sim num prostíbulo. Satsu e ela combinam de fugir em cinco dias, durante a madrugada.

Voltando para o Okiya Nitta, Chiyo vê Hatsumomo com o seu namorado novamente, e ainda que tente se manter em silêncio, ele acaba descobrindo-a e percebendo que ela os viu, sendo casado, termina tudo com Hatsumomo. Furiosa, essa finge estar ajudando a menina a fugir, lhe dando dinheiro e colocando-o em suas roupas, e então a arrasta até a Mamãe, dizendo que descobriu tudo sobre sua tentativa de fuga, e a acusa de ter roubado o seu broche de esmeralda para conseguir dinheiro para ir embora.    

Ao revistarem a menina, de fato encontram dinheiro em sua roupa, e em sua tentativa de defesa, ataca contando sobre ter visto Hatsumomo com seu namorado no quarto de serviço do Okiya. Mamãe confronta Hatsumomo, e ainda que saiba que é verdade, há pouco que pode fazer contra aquela que traz dinheiro para ela. Chiyo recebeu o acréscimo do broche em suas dívidas e a raiva de todas as criadas, pois foram penalizadas por saberem e esconderem o que Hatsumomo fazia. Isso só alimentava a sua vontade de sair dali.

Quando chegou o dia de encontrar e fugir com a sua irmã, Chiyo esperou todos dormirem e foi até o telhado, pois agora a porta era trancada a chave, e essa não saia do pescoço de Titia, lhe restando apenas essa saída. Mas no meio do processo, acaba escorrendo e caindo dentro de outro Okiya, e quebrando o braço ao tentar proteger a sua cabeça.

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Frase do livro “Memórias de uma gueixa”, de Arthur Golden

Vemos em “Memórias de uma gueixa”, que quando descobrem, a arrastam de volta para o Okiya Nitta, onde toma mais uma surra de vara, enquanto ouve que agora jamais se tornará uma gueixa e Abóbora apanhando também, pois não teria ficado de olho nela e nem impedido tudo aquilo de acontecer. Teve acrescentado em suas dívidas as contas médicas e também o valor que um dia foi pago por sua irmã, foi assim que soube que Satsu havia conseguido fugir, a dona do local onde ela estava disse que não pagaria mais a Mamãe o valor pela garota que foi embora, sobrando para ela assumir essa dívida.

Chiyo devia se sentir feliz por sua irmã ter conseguido escapar, mas lhe doía demais ter sido deixada para trás. E agora que todos no Okiya ignoravam a sua presença, ninguém lhe dirigindo a palavra a não ser para uma ordem, sentia apenas solidão. Tempos depois, recebeu uma carta do Sr. Tanaka, que lhe contava que sua mãe havia morrido seis semanas depois que elas partiram, e depois disso, seu pai também havia morrido, aumentando ainda mais sua dor e sua solidão. Estava só nesse mundo.

Um ano e meio depois, quando tinha cerca de 12 anos, ao caminhar pelas ruas de Gion, em suas tarefas, o sentimento que lhe tomava conta era infelicidade, fora condenada as duras condições da vida de criada, sentia que tinha um longo caminho pela frente, mas que não a levava a lugar nenhum. Encarando tudo a sua volta, se via perdida tal qual uma ilha abandonada no meio do oceano, sem passado e sem futuro, lhe restando apenas o cair de lágrimas. Foi então que ouviu uma voz se dirigindo a ela.

Um homem lhe oferecia bondade e gentileza, compreendendo, ainda que não a conhecesse, que alguém, ou mesmo a vida, houvesse sido cruel com ela. Em um instante, ainda que breve, ele doou a ela o seu tempo e sua atenção, lhe mostrando em meio ao seu mundo de dor, um pouco de compaixão. Ele realmente a enxergou. Entregou a ela um lenço para enxugar suas lágrimas e uma moeda para comprar sorvete. Tudo o que ela sabia sobre ele, é que o chamavam de Presidente.

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Frase do livro “Memórias de uma gueixa”, de Arthur Golden

Depois desse encontro, mexida completamente por ele, foi a primeira vez que sentiu inveja de uma gueixa, pois caso fosse uma, poderia seguir acompanhando o Presidente, e encarando todo o movimento a sua volta, foi a primeira vez que se imaginou como uma gueixa, não como um grande objetivo de vida, mas como um degrau para outras coisas. Movida por esse sentimento, correu até o Altar de Gion, jogou as moedas na caixa de ofertório e fez uma oração para os deuses, que eles lhe permitissem, de alguma forma, se tornar uma gueixa. Prometera que suportaria qualquer treinamento e qualquer dureza, por uma oportunidade de atrair outra vez a atenção do Presidente.

Vários meses se passam em “Memórias de uma gueixa”, e em certo dia, a Vovó morre. Por uma semana ou duas, todos no Okiya ficam ocupados, limpando e ajeitando toda a casa, preparando-a para todas as visitas que receberia, pois todos em Gion passariam por lá, prestando suas condolências. O trabalho de Chiyo, naqueles dias, consistia em levar os visitantes da entrada até a sala de recepção. Tinha que observar atentamente as pessoas, decorando quais eram os seus sapatos, pois para manter a entrada livre, levava-os para outro lugar e teria que os trazer de volta quando as pessoas estivessem indo embora. E tinha que fazer isso sem encará-las, para não ser rude.  

Em um determinado dia, vê Mameha entrando no Okiya junto com sua criada, fez tudo o que pode para não chamar a atenção, mesmo que não tenha sido sua culpa, sentia vergonha pelo quimono estragado. No entanto, quando estava indo embora, Mameha parou para falar com ela, perguntando o seu nome e pedindo para que ela a olhasse, ficando impressionada com o tom dos seus olhos.

Cerca de um mês depois, a criada de Mameha aparece no Okiya, dizendo que Chiyo precisava dar um jeito de ser mandada para alguma tarefa no dia seguinte, e que a encontrasse na ponte sobre o riacho. No dia seguinte, ela se viu sentada diante de Mameha em seu apartamento, e ali conversaram sobre Hatsumomo e como ela a trata, sobre o motivo de Mamãe ainda não ter adotado Hatsumomo como filha do Okiya, bem como sobre o motivo de Chiyo não estar estudando para ser uma gueixa.

Chiyo não entendia o que estava fazendo ali, tão pouco quais eram os objetivos de Mameha com essa aproximação, já que ela não era muito clara sobre isso. Acabou concluindo que seria usada para uma vingança contra Hatsumomo, pois sem dúvida as duas eram rivais. E Hatsumomo desprezando-a como a desprezava, seria fácil colocar Chiyo contra ela.

Poucas semanas depois, “Memórias de uma gueixa”, nos mostra Mameha aparecendo no Okiya Nitta, mostrando interesse em Chiyo e em se tornar sua irmã mais velha, para lhe ensinar tudo o que precisava saber sobre ser uma gueixa. Mamãe, interessada apenas no dinheiro que isso poderia lhe trazer, faz um acordo com ela, quase uma espécie de aposta.

Mameha aceitaria treinar Chiyo como sua irmã mais velha, por ganhos bem menores do que estaria habituada a ganhar, mas se Chiyo conseguisse pagar todas as suas dívidas antes dos vinte anos, então Mamãe lhe pagaria o que ela teria recebido normalmente, mais o acréscimo de 30% sobre o valor de seus honorários.

Mameha aceitando a proposta, e tendo Hatsumomo aceitado ser a irmã mais velha de Abóbora, as duas amigas, Chiyo e Abóbora, agora se veem em batalha, disputando cada uma por sua própria sobrevivência, com duas das mais importantes gueixas de Gion, também inimigas, empurrando-as para frente ou até os seus limites. Foi aí que Chiyo passou a ser Sayuri.

Como sobreviver em Gion tendo Hatsumomo em seu encalce? Como driblar difamações criadas em seu nome? Como vencer um oponente? Uma amizade é capaz de sobreviver a uma competição onde o prêmio final é a garantia de um lar? O quanto você pode deixar de ver o outro enquanto luta pela própria sobrevivência? Sayuri será capaz de pagar todas as suas dívidas aos vinte anos? Quais são os reais objetivos de Mameha? E quem será o Presidente?

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Frase do livro “Memórias de uma gueixa”, de Arthur Golden

Um dia, conferindo o seu almanaque, tentando descobrir seus dias de sorte, Sayuri encontra uma frase que lhe desperta a curiosidade: “Equilíbrio de bom e mal pode abrir a porta do destino”. Nesse dia em específico, ela conhecerá dois homens, Iwamura Ken, fundador da Eletrônica Iwamura, e seu braço direito, Nobu Toshikazu, diretor da empresa. Com quem será que seu destino estará entrelaçado? O que significa esse entrelace? O que ganharia ou perderia ao ceder para o próprio destino? O que ganharia ou perderia ao mudar o próprio destino?

Em “Memórias de uma gueixa”, Sayuri aprenderá muitas coisas sobre o universo das gueixas, conceitos, superstições, tradições e rituais, bem como sobre a vida e sobre as pessoas, as estranhezas, futilidades, ganâncias e luxúrias que cercam o mundo dos adultos, em especial dos homens. Até onde alguns são capazes de ir para conseguirem o que querem, o que são capazes de fazer aqueles que estão prestes a perder algo que apreciam ou os que estão feridos, e o que a sobrevivência te obriga a aceitar.

Sayuri conhecerá um mundo marcado por beleza e dor, por muito rigor e pouca bondade, por lealdades e competições, por ganhos e perdas, por talento e resiliência, por muitos jogos de interesse e pouca margem para escolhas pessoais. Um mundo que coloca um preço, financeiro e pessoal, sobre a sua sobrevivência.

A trajetória da personagem em “Memórias de uma gueixa” também é entrelaçada com grandes mudanças históricas, incluindo o impacto da Grande Depressão e da Segunda Guerra Mundial sobre a cultura japonesa. Na Grande Depressão nos é dado um contraste entre um mundo onde se tem pessoas vivendo no desespero, camponeses, homens, mulheres e crianças, famintos, pobres demais até para tomarem um banho, quem dirá terem o que comer, e do outro lado Gion, que parecia não ser afetado por nada disso, pois continuava cercado de luxos e quantias altas de dinheiro, homens ricos continuavam sendo ricos afinal.

Já a Segunda Guerra Mundial nos mostra não só como o país ficou destruído, mas também o seu povo. Como foi, para aqueles que sobreviveram, seguir com suas vidas tendo o exército americano em seu lar. Todas as transformações que foram feitas, tudo o que foi reinventado, mesmo em meio as tradições, para que se pudesse encontrar um jeito de sobreviver, a resiliência de um povo.

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Frase do livro “Memórias de uma gueixa”, de Arthur Golden

Memórias de uma gueixa” é um romance histórico repleto de camadas que nos levam a muitas reflexões sobre a vida e sobre a sociedade japonesa da época. Traz um enredo de formação, lutas, adaptações e readaptações, marcado, a todo momento, pela relação delicada entre o desejo e o destino, o que se quer e o que lhe é imposto, nos fazendo refletir sobre a liberdade em contextos em que há hierarquias rígidas, nos fazendo pensar sobre as diversas versões de nós mesmos, que precisamos assumir diante das circunstâncias, e o preço que pagamos, por vezes alto demais, por essas mudanças.

Memórias de uma gueixa” também nos leva a refletir sobre a perfeição estética, constantemente exigida na cultura das gueixas. Os sacrifícios, físicos e emocionais, que a beleza acaba exigindo, acabam por oferecer uma espécie de “faca de dois gumes”, pois na mesma medida em que lhe abre portas, também pode acabar lhe aprisionando.

O livro também nos leva a olhar além da superfície, além da elegância e encantamento que envolve o universo das gueixas, além do romance, a enxergar as disputas silenciosas, onde utilizam meninas, visando sempre o ganho financeiro, nos convida a enxergar a maneira como esses sistemas hierárquicos e essas sociedades rígidas controlam a vida das mulheres, desde jovens, a ponto até mesmo de vender meninas e leiloar suas virgindades, dando a elas escolhas extremamente limitadas sobre a própria vida. Ganhando muito com elas, mas fazendo pouco por elas.

Arthur Golden, construiu personagens fascinantes, da protagonista a antagonista, passando por aqueles que cruzam seus caminhos, personagens complexos e multifacetados, vulneráveis e contraditórios, cada um carregando sua própria história, seus medos e anseios, seus desejos e suas estratégias de sobrevivência, todos, de alguma maneira, vítimas e instrumentos de um sistema social rígido, que exige perfeição a todo tempo e que constantemente cria rivalidades intensas, a ponto de levar alguns ao limite.   

Memórias de uma gueixa” traz uma escrita rica em detalhes e profundamente imersiva, é quase impossível não se conectar com Sayuri e seus sentimentos ou pensamentos. É como se estivéssemos ali, participando de todos os rituais que definem a rotina das gueixas, dos mais festivos aos mais silenciosos. A linguagem é bem fluída e envolvente, e até um tanto poética, o que eu particularmente gosto. E há um bom equilíbrio no ritmo da narrativa, acelerando nos momentos de mais ação e fazendo as pausas necessárias para explorar melhor as tradições, ou nos momentos de mais introspecção.   

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Frase do livro “Memórias de uma gueixa”, de Arthur Golden

Memórias de uma gueixa”, acredito, traz como seu tema principal a sobrevivência emocional, se manter o mais inteira que conseguir, mesmo diante do quão quebrada for pelo sistema em que vive. A busca por um mínimo de autonomia diante da própria vida. A resiliência e a coragem de criar a própria identidade, em um mundo que só faz restringir.  

É uma obra que toca pela sensibilidade e impressiona pela construção cuidadosa de seu universo. Se interessou? Dá uma chance. Leia e depois venha aqui me contar o que achou.

Curiosidades

Arthur Golden passou cerca de 15 anos pesquisando o universo das gueixas para a construção do livro “Memórias de uma gueixa“. Viajou ao Japão e consultou documentos históricos para construir uma ambientação detalhada, tanto que muitos rituais e elementos de treinamento apresentados no romance são baseados em práticas reais do distrito de Gion, embora alguns tenham sido ficcionalizados para fins narrativos.

Fez inúmeras entrevistas com mulheres que lhe relataram muitas de suas experiências como gueixas, incluindo a Kiharu Nakamura, a Liza Dalby e a Mineko Iwasaki, uma das principais gueixas de Gion nos anos 60 e 70. Tirando daí algumas de suas inspirações para a construção de sua personagem principal, Sayuri.

O livro “Memórias de uma gueixa” se tornou um sucesso mundial, chegando a ser traduzido em mais de 15 países, isso em menos de um ano após ter sido lançado e permaneceu semanas nas listas de mais vendidos. Nos cinemas ganhou uma adaptação dirigida por Rob Marshall, em dezembro de 2005. O filme “Memórias de uma gueixa” chegou a ganhar um Globo de Ouro e 3 Oscars.

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